A veces no sabemos lo mucho que deseamos que algo suceda hasta el mismo momento en que lo que deseamos se decide a suceder. A ella le suspendieron el examen de gallego, en realidad le suspendieron el examen del libro de gallego. Las razones, justas o no, no vienen al caso. Lo que sí interesa es que para recuperar la prueba le exigieron un breve comentario del libro y entonces surgió la pregunta:
-Mamá, cómo hago un comentario del libro?
La memoria casi siempre apuñala por la espalda y me vi de repente en mi ambición más antigua, más arraigada: la Literatura. Me vi en el momento de decidirme a estudiar. Me vi en el momento de tomar la decisión de entregar mi alma a la palabra escrita y poder sembrar palabras sabiendo que alguna tendría que prender.
Sin embargo “mamá, cómo hago un comentario del libro?” me dejó paralizada. Mi ambición se murió por el camino y esa frase la hizo brillar como polvo de fantasmas.
La miré. Yo no había leído el libro. Se trataba de explicar cómo construir un comentario, cualquier comentario, el comentario. Me senté delante de ella en la mesa de la cocina. Siempre es en la cocina. Y le dije agarrando su atención por sorpresa:
-Recuerdas Caperucita Roja?
Lo recordamos las dos porque cuando no podía dormir, poco después de haber nacido, le susurraba al oído, muy despacio, el cuento con la voz muy suave. Porque tenía versiones y versiones de caperucita que le traía cuando estaba malita. Porque era su cuento favorito .
Fue media hora irrepetible. Tal vez más. Ella sola encontró el tiempo, el espacio, los personajes, la voz del narrador, el significado del bosque, del lobo, del camino… la casa de la que sale y a la que llega, la intención…
Y yo sola encontré la manera de encararme a esa vieja frustración o cobardía que vive conmigo.
segunda-feira, 30 de novembro de 2009
domingo, 29 de novembro de 2009
Música venenosa
Soa de pronto o Carmina Burana. Alto e poderoso. Rompe nos ouvidos e na nossa cozinha como uma onda marinha, como o granizo que está a cair contra os vidros. Os olhos do Nicolás alagam-se de tristeza e diz com uma voz aflita um bocadinho impostada:
-Mamai, penso que vas morrer ...
Com as luvas de goma e a baeta ainda nas mãos, volto-me cara a ele:
-Claro, Nico, eu vou morrer um dia, mas ainda falta muuuuuuito tempo. E quando eu morrer tu vas ser maior e...
-Já sei mamai, mas é que esta música tem veneno, e por isso vas morrer.
Não sei como sentem as crianças a música, mas escutam qualquer coisa, algo não escrito, que depois, um bom dia, deixa de soar.
-Mamai, penso que vas morrer ...
Com as luvas de goma e a baeta ainda nas mãos, volto-me cara a ele:
-Claro, Nico, eu vou morrer um dia, mas ainda falta muuuuuuito tempo. E quando eu morrer tu vas ser maior e...
-Já sei mamai, mas é que esta música tem veneno, e por isso vas morrer.
Não sei como sentem as crianças a música, mas escutam qualquer coisa, algo não escrito, que depois, um bom dia, deixa de soar.
quinta-feira, 26 de novembro de 2009
Elvira Ribeiro
"Escachei en balde o cunco dos desexos
Que farei agora
da cautela
derramada?"
De "Arxilosa", um poemário de Elvira Ribeiro. Um amigo descobriu-ma hai apenas umas horas.
Duvidei da escolha da palavra "escachei", mas posta no contexto de argila e cerâmicas,de cacos e estoupidos... talvez o valor fonético seja o adequado.
Parece-me preciosa a imagem da "cautela derramada". Roto o cunco dos desejos, derramada a cautela... satisfeito, talvez, o anseio...ficamos vazios de esperança, de ilusao...
Melhor deixar ficar qualquer coisa em nós, sempre sem cumprir.
Que farei agora
da cautela
derramada?"
De "Arxilosa", um poemário de Elvira Ribeiro. Um amigo descobriu-ma hai apenas umas horas.
Duvidei da escolha da palavra "escachei", mas posta no contexto de argila e cerâmicas,de cacos e estoupidos... talvez o valor fonético seja o adequado.
Parece-me preciosa a imagem da "cautela derramada". Roto o cunco dos desejos, derramada a cautela... satisfeito, talvez, o anseio...ficamos vazios de esperança, de ilusao...
Melhor deixar ficar qualquer coisa em nós, sempre sem cumprir.
quarta-feira, 25 de novembro de 2009
sábado, 21 de novembro de 2009
Linguagem
Sabe que não se podem dizer palavrões, mas a tentação é muito grande e procura sempre o jeito de pronunciar.
-Olha mamai, não vou dizer palavroes, mas vou desenhar.
Colhe a quadro magnético e faz uma garatuja com ar de artista enraivecido.
-Já está! Desenhei “merda”. “Merda” é um palavrão feio! Olha como é feio! Agora vou desenhar “joder”, que é ainda mais feio!
E mais uma vez endemoninhado, garatuja linhas curvas e riscos violentos por todo o quadro.
-Mas Nicolás, isso nao está bem. Os palavrões nao se falam e também nao se pintam. Deixa essa brincadeira.
-Vaaaleee- concede com a sua pequena paciência de quatro anos, da que apenas experimentou o gesto da cabeça e tom da voz–Vou desenhar agora palavrões boínhos.
-E posso saber quais são os palavroes boínhos, Nicolás?
-Pois é, mamai, são os que se podem dizer e não se passa nada, por exemplo “será possível”, “me cachis”, “jolín”... “me caho na mar”...
-“Me caho na mar” não, Nicolás, também é feio...
-Vaaale...- outra vez concede- vou desenhar “jolín”!
E então, com calma, desenha um círculo com um diámetro que o cruza num sorriso amável. E depois continua com outras interjeições variadas, que também têm olhos e nariz, que são mais grandes ou mais pequenas... E eu penso que o Nicolás, com a sua cabecinha de criança, está a fazer a fantástica descoberta da linguagem.
-Olha mamai, não vou dizer palavroes, mas vou desenhar.
Colhe a quadro magnético e faz uma garatuja com ar de artista enraivecido.
-Já está! Desenhei “merda”. “Merda” é um palavrão feio! Olha como é feio! Agora vou desenhar “joder”, que é ainda mais feio!
E mais uma vez endemoninhado, garatuja linhas curvas e riscos violentos por todo o quadro.
-Mas Nicolás, isso nao está bem. Os palavrões nao se falam e também nao se pintam. Deixa essa brincadeira.
-Vaaaleee- concede com a sua pequena paciência de quatro anos, da que apenas experimentou o gesto da cabeça e tom da voz–Vou desenhar agora palavrões boínhos.
-E posso saber quais são os palavroes boínhos, Nicolás?
-Pois é, mamai, são os que se podem dizer e não se passa nada, por exemplo “será possível”, “me cachis”, “jolín”... “me caho na mar”...
-“Me caho na mar” não, Nicolás, também é feio...
-Vaaale...- outra vez concede- vou desenhar “jolín”!
E então, com calma, desenha um círculo com um diámetro que o cruza num sorriso amável. E depois continua com outras interjeições variadas, que também têm olhos e nariz, que são mais grandes ou mais pequenas... E eu penso que o Nicolás, com a sua cabecinha de criança, está a fazer a fantástica descoberta da linguagem.
quinta-feira, 19 de novembro de 2009
PORNOGRAFÍA INFANTIL NAO
... "lolitas" "preteens" "angels" "boylover" "girlover" ...
Se você tem chegado cá a seguir estas pegadas, você está a precisar ajuda:ligue para o seu advogado e para o seu psiquiatra.
Não à pornografia infantil
Se você tem chegado cá a seguir estas pegadas, você está a precisar ajuda:ligue para o seu advogado e para o seu psiquiatra.
Não à pornografia infantil
terça-feira, 17 de novembro de 2009
Nada a dizer
Sem nada a dizer. Hoje apenas sono. Ainda a sombra do fim de semana me estonteia. Apenas sono. Olhos com luzes que por um instante cegam a memória. Risos que estouram, abraços, frases e reencontros e este temor que não me deixa de nunca aprender a estar e ser sempre perfil de reticências.
quarta-feira, 11 de novembro de 2009
Cada día
Laca de uñas
Se llamaba María Eugenia y venía por casa algunas tardes para hacer la manicura a mi madre. Mi hermana y yo, cinco y tres años, revoloteábamos igual que mariposas a su alrededor mientras ella un poco esdrújula y dulce, trabajaba aquellos dedos de mamá, que extendía su mano con gesto de bailarina. Empujaba suavemente la cutícula con un palito de naranjo, limaba con precisión la forma de las uñas y después, con pinceladas seguras, las pintaba de rosa claro. Recuerdo el olor que envolvía entonces la cocina, recuerdo sobre todo el sonido que hacía el frasquito de esmalte cuando lo agitaba entre sus dedos y rozaba en el anillo, una especie de tictictic rápido y divertido que todavía hoy, si lo escucho, me devuelve el perfume de aquella laca.
Una tarde accedió a pintarnos las uñas a nosotras, a mi hermana y a mí. Creo que fue de color rojo y estoy segura de que estábamos felices. Bailábamos y saltábamos por el pasillo con los dedos estirados y soplábamos las puntas como hacía mamá.
Entonces llegó mi padre de la oficina. Corrimos con nuestras manos al aire para mostrarlas. Mi padre, que ya entonces sabía fruncir el entrecejo, acabó la fiesta. Lloramos. Nuestras manos se resistían debajo del grifo en el lavabo. Las uñas parecían viejas y mi madre enfundó su cara en ese silencio, en esa mirada muda que a veces se vestía.
Una tarde accedió a pintarnos las uñas a nosotras, a mi hermana y a mí. Creo que fue de color rojo y estoy segura de que estábamos felices. Bailábamos y saltábamos por el pasillo con los dedos estirados y soplábamos las puntas como hacía mamá.
Entonces llegó mi padre de la oficina. Corrimos con nuestras manos al aire para mostrarlas. Mi padre, que ya entonces sabía fruncir el entrecejo, acabó la fiesta. Lloramos. Nuestras manos se resistían debajo del grifo en el lavabo. Las uñas parecían viejas y mi madre enfundó su cara en ese silencio, en esa mirada muda que a veces se vestía.
terça-feira, 10 de novembro de 2009
A quinta dimensão : o perfil do pirata
-Olha mamai- e mostra os desenhos do conto –O loro está de perfil, vês? Só se lhe vê um olho!
-Pois é, Nico, muito bem!
-O crocodilo está também de perfil... mas o mono está de frente...
-Claro, vês? Tem os dois olhos.
-Olha mamai: o pirata! O pirata está também de perfil: também só tem um olho!!
Felizmente o pirata do conto tinha um sorriso completo, de orelha a orelha e dois arrepiantes furados no nariz.
domingo, 8 de novembro de 2009
Este perro
“Un perro parado
Sobre sus cuatro patas
En medio de la calle
Una farola transpira
Un reguero de luz
que se esparce y me duele
Sobre esa soledad
Pellejo y hambre
Al final de la calle
Los olivares susurran
La luna es alguien
Pero aquí
Yo y ese perro
Que no ladra”.
(P. Cabo)
Voy leyendo a poquitos, a sorbitos.
Sobre sus cuatro patas
En medio de la calle
Una farola transpira
Un reguero de luz
que se esparce y me duele
Sobre esa soledad
Pellejo y hambre
Al final de la calle
Los olivares susurran
La luna es alguien
Pero aquí
Yo y ese perro
Que no ladra”.
(P. Cabo)
Voy leyendo a poquitos, a sorbitos.
sábado, 7 de novembro de 2009
Sábado
Está sentado en la butaca, casi en penumbra, y cuando entro cobra vida en una sonrisa. Por los cristales resbala la lluvia de una tarde de otoño sin rescoldos. Es sábado. No huele a café. Solo esa breve sonrisa en su cara recién regresada del silencio y el sueño.
-Hola, papá, dormías?
Se queja de la lluvia. Me cuenta de nuevo que ha pasado mala noche, que han llamado por teléfono para ofrecerle un seguro y que el caldo de hoy parecía en mal estado.
Pregunto por mi hermana: -has hablado con ella?-
-Precisamente la he llamado esta mañana- me dice, mientras sus ojos adelantan la ironía –la he llamado para preguntarle qué día es hoy, y me ha dicho que es viernes.
-Entonces, papá, la llamaste ayer… porque hoy es sábado.
-Pues entonces la llamé ayer, claro.
Y la mirada con la que pronuncia despacio estas palabras, me deja ver un mismo día de pausas conocidas. Una espera que acecha, y se resigna, en la butaca.
-Hola, papá, dormías?
Se queja de la lluvia. Me cuenta de nuevo que ha pasado mala noche, que han llamado por teléfono para ofrecerle un seguro y que el caldo de hoy parecía en mal estado.
Pregunto por mi hermana: -has hablado con ella?-
-Precisamente la he llamado esta mañana- me dice, mientras sus ojos adelantan la ironía –la he llamado para preguntarle qué día es hoy, y me ha dicho que es viernes.
-Entonces, papá, la llamaste ayer… porque hoy es sábado.
-Pues entonces la llamé ayer, claro.
Y la mirada con la que pronuncia despacio estas palabras, me deja ver un mismo día de pausas conocidas. Una espera que acecha, y se resigna, en la butaca.
quarta-feira, 4 de novembro de 2009
Mordedura
"Agarrado a los huesos
finos
de mi vida
como una mordedura
envenenada
este error
con raíces
que florece
todo el tiempo
larguísimo
en que
ahora
voy
muriendo
tan presente".
(P. Cabo)
finos
de mi vida
como una mordedura
envenenada
este error
con raíces
que florece
todo el tiempo
larguísimo
en que
ahora
voy
muriendo
tan presente".
(P. Cabo)
terça-feira, 3 de novembro de 2009
Uma de medo
-Mamai os zumbis existen?
São ainda seqüelas do Samaím (jalogüin)
-Não, Nicolás, não existem.
-Os dinossauros existiam e já não existem...
-Pois é, Nico, os dinossauros existiram, mas não existem mais. Os zumbis e os fantasmas não existiram antes, nem agora, e nem vão existir nunca.
-Isso, os dinossauros existiam há muito tempo e viviam por todos os países que eram nossos. Mas os fantasmas e os zumbis existem apenas nos contos e também nos sonhos ou se nos disfarçamos.
-Mas se são um disfarce,ou se sao um sonho, são também mentira. Então, não existem nunca.
-Não, não existem nunca.
-Boa noite, Nicolás.
Já pode dormir tranqüilo, a saber que apenas os dinossauros tiveram certeza em todos os países que então eram nossos.
São ainda seqüelas do Samaím (jalogüin)
-Não, Nicolás, não existem.
-Os dinossauros existiam e já não existem...
-Pois é, Nico, os dinossauros existiram, mas não existem mais. Os zumbis e os fantasmas não existiram antes, nem agora, e nem vão existir nunca.
-Isso, os dinossauros existiam há muito tempo e viviam por todos os países que eram nossos. Mas os fantasmas e os zumbis existem apenas nos contos e também nos sonhos ou se nos disfarçamos.
-Mas se são um disfarce,ou se sao um sonho, são também mentira. Então, não existem nunca.
-Não, não existem nunca.
-Boa noite, Nicolás.
Já pode dormir tranqüilo, a saber que apenas os dinossauros tiveram certeza em todos os países que então eram nossos.
domingo, 1 de novembro de 2009
Talvez um blues
Caiu a chuva e ficamos colados aos vidros. Como se a chuva fora um milagre. Caiu a chuva e varreu o medo.
Resvalam pelo caminho os fantasmas rotos, e os gatos e as crianças não se importam. Deixam passar.
Pelos centros comerciais músculos adormecidos arrastam a preguiça de ficar despertos e mendigam anestesia para um domingo.
Mas a chuva cai como uma miragem, com um milagre. E os espelhos são mais piedosos com quem ousa olhar.
Resvalam pelo caminho os fantasmas rotos, e os gatos e as crianças não se importam. Deixam passar.
Pelos centros comerciais músculos adormecidos arrastam a preguiça de ficar despertos e mendigam anestesia para um domingo.
Mas a chuva cai como uma miragem, com um milagre. E os espelhos são mais piedosos com quem ousa olhar.