quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Consciência da infância.

Caminha arredor da mesa e vai pousando as colheres com as suas mãos pequeninhas. Com essa seriedade na rotina que só as crianças sabem guardar. Junto a cada prato, a sua colher. Pergunta cada noite quanto somos a cear, mas ele bem sabe, somos quatro. A seriedade do rito instala-se também no seu olhar e na conversa:
-Melani é o meu coração, mamai. Vou-na querer sempre.
Está namorado. Melani é a conductora do autocarro da escola. Uma rapariga de cabelo encaracolado e sorriso branco. É por ela que termina a tempo o pequeno almoço e sacode os lençois cheios de sono sem terminar.
-Vou-na querer sempre- Insiste.
Mas depois da terceira colher, cuidadosamente pousada junto ao prato vazio, afina o seu pensamento e acrescenta:
-Ainda que, na verdade, tou a pensar... que pode ser que quando seja maior não a saúde. Pode ser que nem a saúde...
-E isso por quê, Nicolás? por quê não ias saudar à Melani?
E sem deixar de arrumar a mesa para a ceia, sem mesmo olhar para mim, resume:
-Porque suponho que já não me vou lembrar. Quando seja maior, não me vou lembrar dela.
E eu calo porque nem sei como sabe, com essas mãos pequeninhas, que a infância fica apagada entre um barulho de dias a desabar em rotina.

3 comentários:

  1. Cando sexa maior terá a memoria, que lle devolverá as miradas e as horas, como a nós. E que non lle falte, deusas, gardádella ben nalgún lugar seguro.

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  2. Fermoso...., qué lindo este anano de cabelos encaracolados tamén.
    beijos dende este frío polar do norte, norte

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  3. Minha linda! no frio polar! cuida-te. Cuida-te muito e volta logo!

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